Chico Buarque de Hollanda
Não sou dada a idolatrias, muito pelo
contrário, por isso não tenho ídolos. Há pessoas que, por seus notórios
trabalhos, me encantam, me chamam especialmente a atenção, e têm toda a
minha admiração e respeito. Nunca fui,
nem mesmo na minha adolescência, de correr atrás de figuras públicas
para pedir autógrafos, muito menos me prestei a varar noites ao ar livre
para assistir o show de algum artista.
Este não é, definitivamente, o meu perfil.
Mas existem duas pessoas a quem admiro com especialíssima deferência, não somente pelo que produzem, e como produzem, a sua arte, como também pela lucidez e a elegância com que se expressam, a cultura que demostram ter, o humor com que enfrentam as várias facetas da fama a que foram alçados pelo seu ofício e, sobretudo, pela dignidade e a coerência de suas opiniões e de seus atos na vida pública. São eles: Fernanda Montenegro e Chico Buarque de Hollanda.
Hoje, evidentemente, por tratar-se do seu aniversário, quero falar do Chico:
Eu poderia aqui repetir o velho jargão de que o Chico entende como ninguém a alma feminina, mas não é esse o caso. Acho que o Chico não entende nada mais do que outros que buscam entender alguma coisa na vida.
O que acontece com o Chico é que ele sabe escrever; ele sabe o sentido das palavras e falar pelas bocas de outrem, como se fosse outrem, como se outrem lhe soprassem aos ouvidos aquilo que querem e precisam dizer, mas não sabem como.
Aí o Chico vai e diz.
E diz com encantamento e precisão, esbanjando estrofes sem desperdiçar versos, valorizando fonemas sem banalizar rimas, tecendo ideias que são nossas e não necessariamente dele, mas que ele percebe com profunda sensibilidade e sabe traduzir como minguém, com requintada simplicidade.
Um certo colega de trabalho uma vez me disse que não gosta das letras do Chico porque são o trabalho de um "arquiteto da palavra". No meu entender, é justamente este o seu maior mérito. Arte não é psicografia ou algo que se encerra com o surgimento de uma inspiração súbita e incontrolável. A verdadeira obra de arte resulta do polimento, da lapidação, da paciência do artista em compor passo a passo a sua criação, que deve trazer uma visão inédita e única para o mundo sobre qualquer coisa.
O universo revelado pela arte "buarqueana" é tão abrangente e avassalador das questões humanas, sua poesia toca com tanta destreza as filigranas dos nossos sentimentos, dos mais cotidianos e mesquinhos aos mais devastadores e inconfessáveis, que somente alguém com enorme desprendimento de si mesmo pode alcançar.
Não que o Chico esteja totalmente isento de vaidade. Nenhum artista está. Mas acredito que sua vaidade está canalizada para a feitura de sua arte, naquilo que ele faz questão de apresentar ao público como resultado do seu trabalho. Ele não chama a atenção para si, não anda cercado por guarda-costas nem se locomove em furgões pretos com vidro fumê. Pelo contrário, seu carro é comum, ele mesmo o dirige; aliás, a maior parte do tempo anda a pé; adentra as livrarias do bairro onde mora, assim como supermercados e restaurantes, senta a uma mesa qualquer, não "fecha a cara" nem fica mandando beijinhos pra quem passa por ele.
Comporta-se realmente como o homem comum que é.
Se é que se pode chamar de comum alguém que deixa para o seu país o legado de uma obra tão vasta, de tamanha importância cultural e artística, como a que este sujeito vem produzindo.
Sim, sou uma apaixonada admiradora deste Francisco, que é de Hollanda, mas é bem brasileiro, buarqueiro; "paratodos" Chico; para todos não, somente para nós "Pedros Pedreiros", comedores de luz nesse imenso "Brejo da Cruz".
(Cecilia Rangel; em 19 de junho de 2014 - pelos 70 anos do nosso artista maior)
Este não é, definitivamente, o meu perfil.
Mas existem duas pessoas a quem admiro com especialíssima deferência, não somente pelo que produzem, e como produzem, a sua arte, como também pela lucidez e a elegância com que se expressam, a cultura que demostram ter, o humor com que enfrentam as várias facetas da fama a que foram alçados pelo seu ofício e, sobretudo, pela dignidade e a coerência de suas opiniões e de seus atos na vida pública. São eles: Fernanda Montenegro e Chico Buarque de Hollanda.
Hoje, evidentemente, por tratar-se do seu aniversário, quero falar do Chico:
Eu poderia aqui repetir o velho jargão de que o Chico entende como ninguém a alma feminina, mas não é esse o caso. Acho que o Chico não entende nada mais do que outros que buscam entender alguma coisa na vida.
O que acontece com o Chico é que ele sabe escrever; ele sabe o sentido das palavras e falar pelas bocas de outrem, como se fosse outrem, como se outrem lhe soprassem aos ouvidos aquilo que querem e precisam dizer, mas não sabem como.
Aí o Chico vai e diz.
E diz com encantamento e precisão, esbanjando estrofes sem desperdiçar versos, valorizando fonemas sem banalizar rimas, tecendo ideias que são nossas e não necessariamente dele, mas que ele percebe com profunda sensibilidade e sabe traduzir como minguém, com requintada simplicidade.
Um certo colega de trabalho uma vez me disse que não gosta das letras do Chico porque são o trabalho de um "arquiteto da palavra". No meu entender, é justamente este o seu maior mérito. Arte não é psicografia ou algo que se encerra com o surgimento de uma inspiração súbita e incontrolável. A verdadeira obra de arte resulta do polimento, da lapidação, da paciência do artista em compor passo a passo a sua criação, que deve trazer uma visão inédita e única para o mundo sobre qualquer coisa.
O universo revelado pela arte "buarqueana" é tão abrangente e avassalador das questões humanas, sua poesia toca com tanta destreza as filigranas dos nossos sentimentos, dos mais cotidianos e mesquinhos aos mais devastadores e inconfessáveis, que somente alguém com enorme desprendimento de si mesmo pode alcançar.
Não que o Chico esteja totalmente isento de vaidade. Nenhum artista está. Mas acredito que sua vaidade está canalizada para a feitura de sua arte, naquilo que ele faz questão de apresentar ao público como resultado do seu trabalho. Ele não chama a atenção para si, não anda cercado por guarda-costas nem se locomove em furgões pretos com vidro fumê. Pelo contrário, seu carro é comum, ele mesmo o dirige; aliás, a maior parte do tempo anda a pé; adentra as livrarias do bairro onde mora, assim como supermercados e restaurantes, senta a uma mesa qualquer, não "fecha a cara" nem fica mandando beijinhos pra quem passa por ele.
Comporta-se realmente como o homem comum que é.
Se é que se pode chamar de comum alguém que deixa para o seu país o legado de uma obra tão vasta, de tamanha importância cultural e artística, como a que este sujeito vem produzindo.
Sim, sou uma apaixonada admiradora deste Francisco, que é de Hollanda, mas é bem brasileiro, buarqueiro; "paratodos" Chico; para todos não, somente para nós "Pedros Pedreiros", comedores de luz nesse imenso "Brejo da Cruz".
(Cecilia Rangel; em 19 de junho de 2014 - pelos 70 anos do nosso artista maior)
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