VIDA ATELIÊ
ELISA LUCINDA
"Pouca gente se dá conta,
mas estamos preparando sem pensar e aos poucos,
sem saber e sempre,
a nossa máscara da velhice.
Estamos durante a vida, desde meninos,
esculpindo talhe a talhe a fôrma da escultura na qual teremos resultado.
Estamos preparando a mostra, a vernissage do nosso rosto definitivo.
Seremos no desfecho a cara com as linhas da coroa e vice-versa.
Nosso avesso lá estará
no hidrográfico bordado dos rios do riso e dos rios do sofrimento.
Quero no meu rosto o bom retrato falado de cada vão momento,
na cama com o amor, na mesa com os filhos, no bar com os amigos,
na noite sobre o travesseiro de macela,
nas festas com os cúmplices de caminho, nas decisões sensatas de trabalho.
Tudo isso nosso rosto fotografa.
Eu quero nele estas fotografias.
Seremos nosso porta-retrato.
E já estamos portando essa tela.
Nela estará certamente uma verdade anterior:
a superestimação dos bisturis periféricos da vaidade
que nada podem contra o que se viveu e como se viveu,
pois o que projeta, define e esculpe a face é o que nos cabe diariamente;
a gestão dos nossos acontecimentos,
a quantidade de natureza que se experimentou,
as doses de buzinas urbanas, os saldos de bancos,
sonhos e objetivos atingidos na longa jornada
Isso é o que importará.
A quantidade de arroz soltinho que se fez durante a vida,
o tempero diário do feijão amoroso,
o gozo junto com o companheiro,
tudo vai pra conta da cara da velhice, tudo vai pra lá.
Nosso rosto de velhos é o nosso último boletim na escola da vida,
e a expressão que tiver afinal."
COM LICENÇA POÉTICA
ADÉLIA PRADO
"Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria, sua raíz vai até o mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou."
FERNANDA MONTENEGRO
"É um ofício lento, fugidio, buscar o outro, confundir-se com o outro.
Morrer sob um rosto que não é seu é um ofício lento, fugidio.
Lentamente percorrer os séculos
e os espíritos imitando o homem.
Como pode ser tal como é?
É um ofício lento, fugidio.
Ofício de visionários, de loucos pousados na lucidez,
de viajantes do tempo
de viajantes das almas.
É um ofício lento, fugidio, de absoluta tolerância, nenhuma negligência.
É, o nosso ofício é nossa festa, o suor do nosso rosto,
o nosso prêmio!"

CLARICE LISPECTOR
"Não existirá nenhum espaço dentro de mim
para eu saber que existe o tempo, os homens, as dimensões.
Não haverá nenhum espaço dentro de mim
para eu notar sequer que estarei criando instante por instante,
não instante por instante: sempre fundido,
porque então viverei, só então viverei maior do que na infância,
serei brutal e malfeita como uma pedra,
serei leve e vaga como o que se sente e não se entende,
me ultrapassarei em ondas."
"Se uma pessoa fizesse apenas o que entende,
jamais avançaria um passo."
Caríssima Cecília
ResponderExcluirAdmirador das Almas Gêmeas e Parceiro na geração de VIDA com ELAS "rendo homenagens, minha gratidão, e peço-lhes sua Bênção; à todas".
Faço aqui, Cecília, o que já deveria ter feito há muito tempo: ser seguidor oficial desses seus "Filos & Falus". É minha homenagem e admiração a você, Mulher Especial e a todas as que você trouxe aqui com seus textos. Bjus
Obrigada pela sua delicadeza e atenção!
ExcluirBeijos!!!
Querida Cecilia,
ResponderExcluirTua sensibilidade e percepção mergulhando a vida por aí afora enchem de orgulho essa nossa amizade.
Minha admiração.
bjss
Sonia Clara